Search
Close this search box.
LogoLPPrincipal Colorido

A palavra é cor: Ana Maria Gonçalves e o grito negro que ecoa na ABL

Imagem criada com IA

Imagem: africanize.com

Ana Maria Gonçalves: a primeira mulher negra imortal da ABL quebra barreiras na literatura brasileira

Para o presidente da ABL, Merval Pereira, Ana Maria “é uma das maiores escritoras brasileiras dos últimos anos”.

“O livro Um Defeito de Cor foi considerado o mais importante da literatura brasileira dos últimos 25 anos. Só por isso, ela merece entrar para a ABL. Além disso, é uma mulher negra, e a Academia está empenhada em aumentar sua representatividade entre os pares. Ana Maria terá a função de demonstrar que a ABL está sempre em busca de ampliar sua diversidade de gênero, cor e qualquer aspecto que represente a cultura brasileira. Queremos ser reconhecidos como uma instituição cultural que represente o Brasil, a diversidade brasileira. Ela aumenta nossa vontade de estar sempre presente nos movimentos sociais relevantes”, afirmou Merval.

Fonte: G1 – Ana Maria Gonçalves é eleita para a ABL

A grande dúvida é… Por que demorou tanto? Fica a reflexão.

 A palavra é cor: Ana Maria Gonçalves e o grito negro que ecoa na ABL

No dia 10 de julho de 2025, o Brasil quilombola respirou fundo. Ana Maria Gonçalves quebrou um silêncio de 128 anos, tornando-se a primeira mulher negra a ocupar uma cadeira na Academia Brasileira de Letras (ABL). Um reconhecimento, mesmo que tardio — afinal, outros nomes de peso já se candidataram, como a queridíssima Conceição Evaristo. Ainda assim, é uma vitória que desestabiliza as estruturas engessadas da elite literária brasileira.

Ana Maria agora ocupa a cadeira nº 33, que pertenceu ao filólogo Evanildo Bechara. Mineira de Ibiá, com 55 anos, é publicitária, escritora, roteirista e dramaturga — e agora, imortal.

Uma de suas obras mais aclamadas é Um Defeito de Cor, assunto que já rendeu coluna aqui no nosso blog, que vai além da ficção: é um quilombo de palavras. Inspirada na trajetória de Luísa Mahin, mulher africana, estrategista de revoltas e mãe do poeta abolicionista Luís Gama, a obra entrelaça ficção, memória e denúncia num épico que já foi reconhecido como “o mais importante da literatura brasileira dos últimos 25 anos”.

Não à toa, o romance foi enredo da Portela no Carnaval de 2024, como já descrito aqui no nosso blog, rendeu à escola o Estandarte de Ouro, e à autora, o Prêmio Casa de Las Américas (2007) — uma das maiores distinções da literatura latino-americana.

Um Defeito de Cor não é apenas um romance — é o corpo literário da luta preta no Brasil, encarnado numa mulher que sobreviveu ao inimaginável para manter vivas suas raízes.

Ana Maria Gonçalves, com a firmeza de quem carrega a dor ancestral nos ossos e nas palavras, define sua obra como a história de “uma mãe, heroína, filha de África, que pariu a liberdade dessa nação.”

Mais do que literatura, é um grito ancestral que atravessa o Atlântico, desafia o esquecimento e planta resistência em solo brasileiro.

 Representatividade ou reparação?

Oitenta anos. Esse foi o tempo que a ABL levou, desde a sua fundação em 20 de julho de 1897, até eleger uma mulher: Rachel de Queiroz, em 1977. De lá para cá, outras mulheres brancas foram imortalizadas. Mas mulheres negras? Nenhuma — até agora.

E não por falta de nomes. Conceição Evaristo, uma das maiores escritoras vivas do país, foi preterida. A estrutura da ABL, majoritariamente masculina, branca e elitista, historicamente funcionou como um filtro de exclusão.

Sejamos francos: o que está em jogo aqui não é apenas representatividade. É reparação simbólica e cultural. É o início — tardio — de um desmonte das estruturas coloniais que ainda definem quem é ou não legitimado a escrever o Brasil.

Ana Maria Gonçalves não está apenas ocupando um espaço — ela está reescrevendo o cânone com tintas afro-brasileiras.

Ana Maria é só o começo

A eleição de Ana Maria Gonçalves não apaga a dívida histórica. Mas inaugura uma nova página — e essa página é preta, é feminina, é insurgente.

Ela traz consigo vozes abafadas por séculos, e acende um sinal: a Academia, mesmo a passos lentos, começa a se curvar à força da literatura que vem das margens. Do gueto. Do quilombo. Da encruzilhada.

Ela é o começo.
O começo de um Brasil que finalmente começa a se reconhecer…

Por Ladylene Aparecida
Colunista e membro do Instituto

Licença Creative Commons CC BY-NC-ND 4.0: O conteúdo do blog pode ser reproduzido sob as condições estabelecidas pela Licença Creative Commons CC BY-NC-ND 4.0. Esta licença permite que o material seja copiado e redistribuído apenas se for garantida a atribuição aos autores de cada conteúdo reproduzido, bem ao blog do Instituto LetraPreta. A utilização desta licença só é possível para uso não comercial, sem qualquer tipo de modificação. Os termos da licença podem ser consultados em: https://creativecommons.org/licenses/by-nc-nd/4.0/deed.pt

Facebook
Twitter
LinkedIn
Pinterest

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

PESQUISAR NO BLOG
Em destaque
Compartilhe nas redes sociais
Facebook
Pinterest
WhatsApp
LinkedIn
Twitter
Email
Facebook