A pobreza e a dificuldade de ter o básico são feridas abertas em muitos lares brasileiros. Não se trata apenas da falta de alimento; é a ausência de dignidade, a negação do direito ao lazer, ao conhecimento, à tecnologia e ao próprio espaço de pertencimento. Essa vulnerabilidade social ressoa em problemas de autoestima, autoconhecimento e relacionamentos familiares, permeada por preconceitos que estreitam ainda mais as margens da sobrevivência.
Quando completei 17 anos e, como diz no Ceará “terminei os estudos”, me vi diante de um dilema cruel: permanecer ao lado da minha mãe ou buscar uma vida com mais oportunidades na capital. Na ingenuidade da juventude, deixei minha casa e minha família para trás, impulsionada pela esperança de uma vida melhor. Mas ao adentrar a vida adulta, as dificuldades se multiplicaram. A realidade brutal da desigualdade se revelou, e eu percebi que o que mais desejava era o aconchego do meu Lar. Mas como retornar, se as oportunidades de uma vida “melhor” estão distantes e como trazer minha família se ainda sou parte da pobreza?
Como mulher, os desafios se intensificaram. Enfrentar preconceitos e discriminação é uma constante. Nas grandes metrópoles, somos confrontadas não apenas com a dura realidade econômica, mas também com o machismo e a violência de gênero. A escritora Djamila Ribeiro nos diz que “Ser mulher é viver uma constante batalha contra o invisível. O preconceito não é apenas uma opinião, é uma barreira que impede o progresso.” A luta diária por um espaço digno e seguro é real e implacável. A dificuldade de manter um emprego, pagar ou se manter na universidade e enfrentar situações de vulnerabilidade são agravadas pela necessidade de lidar com riscos específicos, como a violência urbana e a insegurança.
Essa é a realidade de muitos pais e jovens que abandonam suas raízes em busca de melhores condições nas grandes metrópoles, fugindo da fome e da necessidade. Mesmo com todos os desafios, com a dificuldade de manter um emprego e enfrentar situações que nunca imaginei, percebo que minha luta é apenas uma entre muitas lutas de milhares de mulheres no Brasil.
“A resistência é a luta diária que nos molda, é o fogo que nos forja no calor das adversidades.” — Racionais MC’s.
O discurso de “se você se esforçar, você consegue” já não ressoa mais verdadeiramente. Estamos cansados da retórica vazia de força e fé. Precisamos de uma compreensão profunda para que se criem e revoguem não apenas políticas públicas, mas uma mudança cultural em todos os níveis: nas empresas, nos lares, nos bares, nos grupos de amigos e na sociedade em geral. É imperativo que espaços sejam abertos e oportunidades sejam criadas para aqueles que mais precisam e que as mulheres possam ser respeitadas.
Por Suyane Lopes
Escritora e membro do Instituto
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Uma resposta
Obrigado por essa escrita carregada de afetos Suyane. A postagem me pega em um momento muito vulnerável e me acolhe apontando a necessidade de lutarmos com esperança para uma sociedade cada vez menos preconceituosa e cada vez mais diversificada. Que possamos transgredir os espaços e gritar a plenos pulmões que lutamos com fé e a mesma não costuma falhar por nada.
Viva as mulheres negras!