Nascida no coração de Belo Horizonte, em 29 de novembro de 1946, Conceição Evaristo cresceu entre palavras sussurradas nas cozinhas, nas ruas da periferia, nas cantigas que embalavam a memória de sua gente. Filha de uma realidade dura, atravessada pela pobreza e pelo racismo, transformou a dor em força, e a resistência em escrita. Desde pequena, percebeu que havia uma força viva na palavra uma força que poderia acolher, denunciar e libertar.
Ainda menina, em 1958, quando terminou o primário, escreveu uma redação com o título “Por que me orgulho de ser brasileira”. E não apenas escreveu: venceu o concurso da escola e ali ganhou seu primeiro prêmio literário. Era o início de uma trajetória que romperia os muros invisíveis da exclusão. Já aos 17 anos, integrou a Juventude Operária Católica (JOC), grupo que instigava reflexões profundas sobre o Brasil e onde Conceição começou a organizar seu pensamento crítico sobre as estruturas que silenciavam corpos como o seu.
A vida nunca lhe foi fácil. Trabalhou como empregada doméstica enquanto lutava para concluir o Curso Normal, formando-se professora aos 25 anos. Depois, com coragem e decisão, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde passou em concurso e começou a ensinar na rede pública. Mas ela queria mais: queria entender, questionar, escrever e foi além. Fez faculdade, mestrado, doutorado em Literatura Comparada. E, com isso, reinventou não só sua trajetória, mas também a forma como o Brasil escutava suas vozes apagadas.
Seu nome passou a ecoar nas páginas da série Cadernos Negros, onde seus primeiros contos e poemas ganharam forma e fôlego. E em 2003, o país conheceu Ponciá Vicêncio, seu primeiro romance, um grito literário contra a opressão, um canto em honra à ancestralidade. Conceição escreve com o corpo, com a memória, com a alma. Sua literatura é marcada pelo conceito de “escrevivência”: uma escrita que nasce da vivência de mulheres negras, carregada de dor, beleza e resistência.
Seu talento foi reconhecido com prêmios importantes: o Prêmio Jabuti em 2015, pelo livro Olhos d’Água; o Prêmio Faz Diferença, do jornal O Globo, em 2016; e, em 2017, o Prêmio de Literatura do Governo de Minas Gerais pelo conjunto de sua obra. Cada reconhecimento é também um gesto de reparação histórica, uma afirmação de que a literatura brasileira precisa e sempre precisou das palavras negras.
Hoje, Conceição Evaristo é uma das vozes mais potentes da literatura contemporânea. Não apenas por seu talento com as palavras, mas porque sua trajetória é, em si, um manifesto. Ela nos ensina que a escrita pode ser refúgio, denúncia, espelho e ponte. Que há uma dignidade profunda na memória ancestral. E que nenhuma história é pequena demais quando contada com coragem.
Porque, como ela mesma já afirmou, “nossos passos vêm de longe”. E Conceição segue escrevendo não só com a caneta, mas com a alma inteira.
Fonte:
https://mundoeducacao.uol.com.br/literatura/conceicao-evaristo.htm acesso em:17/07/2025
Colunista e membro do Instituto

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