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Férias? Nosso corre sempre foi outro!

Imagem criada com IA

Créditos: Foto pública, retirada de Lance.com

 

Já parou pra pensar que nós enriquecemos a Europa?

Pois foi! Exatamente assim!

O tráfico de pessoas escravizadas e a exploração das riquezas das colônias  possibilitaram o acúmulo de capital jamais experienciado pelas superpotências da época. Assim, o “trabalho” não remunerado de pessoas negras foi crucial para o enriquecimento que se desdobrou na industrialização/mecanização da Europa.[1][2]

Sim, na corrida do dinheiro pelo dinheiro, eles largaram na frente! O trabalho injusto, inglório e desumano nas colônias possibilitou que pessoas livres se tornassem assalariadas do outro lado do atlântico. Mas nem tudo são flores, essas pessoas viveram outros tipos de exploração e desumanização, rebelaram-se, e garantiram direitos.

Não preciso te lembrar o lugar das pessoas negras no mundo enquanto a Inglaterra concedia férias aos trabalhadores industriais pela primeira vez,  em 1872, preciso? Lá, já libertos, trabalhavam nas indústrias e acompanharam a onda. Em Áfrika- apesar do tráfico transatlântico ser proibido em alguns países desde 1807 – estávamos ainda em luta pela resistência ao comércio escravista, e à expansão do colonialismo em nossas terras. Por aqui ainda estávamos escravizados, focados em outra luta, a da libertação.

Contextos diferentes… Lutas diferentes!

No Brasil o direito às férias só chegou – em forma de projeto – em 1924 para funcionários  de indústrias, comércio e bancos. Acho que também não preciso te lembrar que não fazíamos parte de nenhum destes grupos.

Parece que faz séculos, mas na verdade foi ontem, e se você olhar através do nosso olhar, de um olhar pretificado, o olhar do Letra, 1924 foi apenas 36 anos após o ato final que determinou o fim da escravização no Brasil, ou seja, o povo preto não ocupava esses lugares.

A reflexão aqui é que, da mesma forma que lutas feministas generalizadas  não alcançam as realidades vividas por mulheres negras periféricas (evidenciando a ramificação necessária por um feminismo negro diferente de um feminismo branco), muitas questões de classe também não alcançam nosso povo.[3]

As políticas trabalhistas implementadas por Getúlio Vargas nas décadas de 1930, 1940 e 1950 – direcionadas aos trabalhadores formais – como a carteira de trabalho, o salário mínimo, férias e licença-maternidade não chegaram à maioria da população negra porque estavam, e ainda estão, na informalidade.

O nosso corre era, e continua sendo outro!

O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) aponta que, apesar de ser maioria da população, o povo negro-brasileiro ganha 61% menos que o povo não-negro empregado. Diz também que os postos de trabalho informais são ocupados majoritariamente por pessoas de pele negra. E diz mais: pessoas de pele clara têm mais facilidade de serem escolhidas quando o quesito é empregabilidade.[4]

Dinheiro e trabalho estão diretamente relacionados aos padrões de vida e à distribuição de rendimentos. Um povo que ganha 61% menos, e que está majoritariamente “empregado” em atividades informais não está, em sua maioria,  viajando para o exterior nas suas férias… Não está viajando entre estados do próprio país… Não está viajando! Não está nos clubes privados, em resorts, velejando, ou curtindo seu tempo ocioso… Não está de férias!

O conceito de Férias é um fenômeno social que não nos atende. E é claro que não estamos aqui falando dos negros bem-sucedidos que fazem parte do seu restrito ciclo pessoal. Estamos falando de 56% da população brasileira, da maioria!

Metade das pessoas negras que você conhece está confortável financeiramente? Curtindo férias?

A realidade velada (assim como o racismo no Brasil) é que a maioria das pessoas negras estão em subempregos, lutando para apenas pagar suas contas, e isso não é por falta de esforço ou porque são preguiçosos como defendem os meritocratas. É resultado de um país que nos retirou da senzala e nos jogou à sarjeta. Sem respeito, sem direitos!

Implica dizer que, na desumana luta capitalista, largamos em último lugar, e estamos, há 137 anos, tentando furar a bolha… Tentando existir para além de resistir… Tentando usufruir da equidade… Tentando, finalmente, sair de férias!

[1] Para saber mais leia A economia do negro no Brasil  de Wilson do Nascimento Barbosa e, Discurso sobre o colonialismo, de Aimé Césaire.

[2] Ibid [1]

[3] Para saber mais leia Mulheres, Raça e Classe, de Angela Davis.

[4] Relatório Síntese de Indicadores Sociais, IBGE, 2022.

Por Viviane Alves
Colunista e membro do Instituto 

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